“Nas Ramas da Esperança” é finalista da categoria Desenvolvimento Social do Prêmio Espírito Público
Por Célia Costa — Especial para República.org
A agricultura familiar é um dos principais instrumentos para combater a fome e a pobreza extrema no Brasil. Com base nessa premissa, o projeto “Nas Ramas da Esperança” fornece mudas de alimentos biofortificados a pequenos produtores, a fim de garantir a segurança alimentar e nutricional das populações mais vulneráveis do sertão pernambucano.
O principal produto é uma variedade de batata-doce resistente ao solo semiárido.
Coordenado pelo professor de agroecologia do Instituto Federal do Sertão Pernambucano (IFSertãoPE), Erbs Cintra de Souza Gomes, o projeto começou em 2010 em parceria com alunos bolsistas do curso de Agronomia.
“Nas Ramas da Esperança” é um dos finalistas na categoria Desenvolvimento Social do 6º Prêmio Espírito Público, que reconhece e valoriza profissionais públicos. A premiação é realizada pela parceria Vamos.
Dificuldade de plantio em solo árido impulsiona produção de alimentos biofortificados
Nascido e criado em Serra Talhada, Erbs viu de perto as dificuldades de plantar no solo árido da região e enfrentar longos períodos de seca. Após viajar pelo Brasil observando a agricultura em diversos tipos de solo, ele decidiu cursar Tecnologia em Gestão da Fruticultura Irrigada no IFSertãoPE, em Petrolina, principal núcleo urbano do sertão de Pernambuco, rodeado por assentamentos agrícolas.
O servidor público aponta que o nome do projeto foi inspirado na batata-doce, cultivada em ramas e essencial na dieta das famílias do sertão. Ao longo dos anos, foi implementado um banco de mudas de variedades biofortificadas de batata-doce, resultantes de cruzamentos que ampliam o valor nutricional do produto colhido. As mudas são entregues aos produtores no tamanho apropriado para plantio, juntamente com acompanhamento e assistência técnica.
Biofortificação garante alimentos mais nutritivos
Biofortificação é o processo de aumentar o conteúdo nutricional de micronutrientes, como vitaminas e minerais, das partes comestíveis das plantas, usando técnicas de melhoramento convencional ou biotecnologia.
“A ideia de estudar a batata-doce surgiu durante uma pesquisa de combate à fome, que buscava alimentos que tolerassem a seca”, explica Erbs. “Descobrimos então os alimentos biofortificados que faziam parte das pesquisas da Embrapa Hortaliças. Uma pesquisadora nos enviou seis genótipos. Iniciamos os testes em 2010 para buscar a variedade de batata-doce que melhor se adaptasse ao solo árido. Em 2021, a Embrapa nos enviou mais 16 tipos, sendo três biofortificados. Somente depois de 11 anos após o começo do projeto, conseguimos a tecnologia para determinar as características do cultivo.”
Variedade resistente à seca homenageia pesquisadora da Embrapa
Atualmente, a equipe do projeto é formada por cinco pessoas, além de outros colaboradores, e conta com a parceria da Embrapa. A variedade que mais se adaptou foi a Nuti, nomeada em homenagem à pesquisadora Marília Regini Nuti. A batata-doce rosada com polpa alaranjada tem alto teor de betacaroteno e vitamina A, oferecendo um valor nutricional superior ao das batatas convencionais. Seu consumo é uma alternativa importante para melhorar a segurança alimentar de populações vulneráveis.
Além do valor nutricional, a Nuti apresenta alta produtividade mesmo no solo árido, com colheitas de 30 a 35 toneladas por hectare, comparadas às 12 toneladas por hectare das variedades convencionais. A irrigação semanal é recomendada, mas, segundo Erbs, há testes indicando que ela pode ser feita a cada 15 dias após os primeiros 30 dias de plantio. Por ser biofortificada, a planta também é mais resistente a pragas e doenças.
Projeto já distribuiu 500 mil mudas em 142 cidades
As primeiras plantas foram distribuídas em 2021. Cinco mil mudas foram entregues à agrovila Associação de Moradores e Pequenos Agricultores do N-4, no Perímetro Irrigado Senador Coelho, zona rural de Petrolina. A entidade tem 736 famílias cadastradas. Até o momento, foram distribuídas 500 mil ramas, totalizando 26,5 toneladas, beneficiando direta e indiretamente dez mil agricultores em 152 cidades de dez estados.
“É gratificante constatar que, durante a visita às áreas de plantio, a batata-doce de polpa alaranjada é uma das principais refeições das famílias. Ouvi relatos de agricultores que ficaram oito anos sem conseguir cultivar alimentos em suas roças e hoje estão com vários canteiros produzindo”, conta o pesquisador.
As pesquisas avançaram para outras culturas no semiárido, com 22 variedades de batatas-doces, feijão, milho e mandioca. A abóbora, conhecida como jerimum no Nordeste, também pode ser biofortificada. Os alimentos do projeto foram incluídos na merenda das escolas municipais de Petrolina por decreto.
“Meu sonho é que o projeto se torne uma política pública para combater a insegurança alimentar“, conclui Erbs.