Resumo
O planejamento e dimensionamento da força de trabalho no setor público federal são essenciais para garantir a alocação eficiente de profissionais e a entrega de serviços de qualidade à população. O Dimensionamento da Força de Trabalho (DFT) permite que órgãos públicos analisem suas necessidades, ajustem suas equipes e implementem políticas estratégicas para melhorar a gestão de pessoas. Com a adoção do DFT, o governo pode otimizar concursos, movimentações e contratações, promovendo eficiência e inovação na administração pública. A implementação dessa metodologia fortalece a capacidade estatal, tornando o serviço público mais ágil e preparado para os desafios do século XXI.
Índice
Composição e reposição de profissionais são essenciais para garantir qualidade e a continuidade dos serviços públicos
Dimensionamento da força de trabalho não é feito com base em estratégia no Brasil
Ferramenta de planejamento vai além do cálculo de pessoal: mira os objetivos das políticas
Indicadores qualitativos e quantitativos embasam decisões sobre gestão de pessoas
Institucionalizar prática do dimensionamento da força de trabalho no setor público é desafio
O serviço público federal enfrenta desafios constantes na busca por atender de forma satisfatória às demandas crescentes dos cidadãos. Enquanto a disseminação das mídias proporciona um acesso mais fácil e rápido à informação, permitindo que a cidadania conheça melhor seus direitos, o crescimento urbano e as mudanças sociais trazem novas exigências para o Estado. Nesse contexto, a administração pública deve se adaptar e alinhar sua oferta de bens e serviços às necessidades reais da sociedade.
Um elemento crítico para o sucesso dessa adaptação é o corpo de profissionais que desempenham funções públicas, que precisam estar capacitados para entregar os resultados esperados em áreas como educação, saúde, meio ambiente, segurança e regulação. A gestão deve contar com a quantidade adequada de pessoas e as competências necessárias para atender às demandas presentes e futuras de maneira adequada.
Composição e reposição de profissionais são essenciais para garantir qualidade e a continuidade dos serviços públicos
No entanto, a composição e a reposição da força de trabalho no setor público têm sido um desafio cada vez mais complexo, especialmente em termos de velocidade e quantidade, essenciais para garantir a qualidade e a continuidade dos serviços públicos. Além disso, o fortalecimento da capacidade estatal também depende da prontidão do Estado para se adaptar às demandas emergentes de profissionais qualificados. Isso coloca a gestão de pessoas como função necessária para a inovação e a melhoria do setor público, no enfrentamento dos problemas essenciais da sociedade, cada vez mais amplos e intersetoriais.
Nesse cenário, o planejamento e o dimensionamento da força de trabalho são ferramentas indispensáveis para o embasamento de decisões estratégicas em gestão de pessoas no setor público federal. O planejamento da força de trabalho, que tem o dimensionamento como instrumento, fornece informações para que os órgãos selecionem as pessoas certas, com o perfil adequado, na quantidade, nos lugares e nos momentos certos ao longo do tempo para cumprir sua missão institucional.
Em outras palavras, envolve processos, práticas e tecnologias de gestão de pessoas que garantem a formação de equipes eficientes e efetivas, alocando-as adequadamente para alcançar metas e objetivos institucionais. Para que isso ocorra, contudo, o planejamento da força de trabalho deve permear toda a organização e envolver uma comunicação efetiva entre a área de gestão de pessoas e as áreas estratégicas da organização. Esta não tem sido, entretanto, a realidade da administração federal.
Dimensionamento da força de trabalho não é feito com base em estratégia no Brasil
Até aqui, a discussão sobre força de trabalho na administração pública esteve posicionada em uma agenda bem menos estratégica, alocada dentre o rol de atribuições logísticas e operacionais que cada órgão dispõe na administração de seus recursos para prover as políticas públicas a seu encargo. Estudo realizado pelo BID sobre a estrutura do sistema de gestão de pessoas do Brasil e demais países da América Latina, que coleta dados desde 2003, aponta que o planejamento da força de trabalho no Brasil não tem derivado da agenda de prioridades e orientações estratégicas do governo federal (BID, 2023)1.
Assim como a organização de concursos públicos, o planejamento de pessoal nos órgãos setoriais esteve sempre relacionado a processos de trabalho protocolares e procedimentais, subordinado a negociações em torno do orçamento e ao poder de barganha de cada órgão. A difusão da metodologia de Dimensionamento da Força de Trabalho (DFT) na administração federal a partir de 2023 oportuniza uma nova fase para a gestão estratégica de pessoas.
O DFT já vinha sendo aplicado na administração federal desde 2016, mas, a partir de 2023, o MGI passou a apoiar a implantação da metodologia nos órgãos com mentoria especializada até a conclusão, priorizando órgãos da administração direta e com pedidos de concurso em andamento. Como resultado dessa mudança, houve um salto muito positivo na dinâmica de implementação. Evidência disso é o fato de que, entre 2016 e 2022, o Sistema de Dimensionamento de Pessoal (SISDIP) contava com 29 órgãos e 150 unidades com DFT concluído. Já em 2023, esse número passou para 61 órgãos com 1.143 unidades dimensionadas. Em 2024, alcançou 85 órgãos e 2.188 unidades com ciclo completo de DFT concluído. Isso significa uma evolução média de 5 unidades dimensionadas por órgão, entre 2016 a 2022, para 25 unidades por órgão, em 2024.
Ferramenta de planejamento vai além do cálculo de pessoal: mira os objetivos das políticas
O DFT é uma ferramenta de planejamento que busca definir as necessidades de pessoal em termos quantitativos e qualitativos para a execução de determinado trabalho, subsidiando políticas de gestão de pessoas com evidências sobre o ambiente de trabalho e as equipes envolvidas. Não se trata apenas de calcular quantos servidores são necessários para ocupar vagas devido a aposentadorias ou evasões, mas de avaliar o que a organização pretende entregar à população e alcançar no futuro, levando em conta as transformações da sociedade e do mercado de trabalho.
Nesse sentido, o DFT desempenha um papel crucial ao fornecer diagnósticos sobre onde os esforços dos profissionais de uma organização estão sendo concentrados, permitindo redirecioná-los de acordo com as prioridades de governo a cargo de cada órgão. Também influencia os processos de recrutamento, seleção e alocação de pessoal, fornecendo informações objetivas para negociações sobre recomposição da força de trabalho, concursos públicos, contratações temporárias e movimentação de servidores. Além disso, promove análises que contribuem para o aprimoramento das políticas de gestão de pessoas e o funcionamento eficaz do setor público.
O Modelo Referencial de Dimensionamento da Força de Trabalho, desenvolvido em colaboração entre o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI) e a Universidade de Brasília (UnB), é uma ferramenta disponível para todos os órgãos da administração pública, abrangendo diversos contextos e tipos de atividades. Esse modelo oferece uma abordagem flexível, levando em consideração as características específicas de cada órgão. Sua maior contribuição para o órgão em que é implementado é revelar de forma estruturada à alta direção o detalhamento das entregas consideradas essenciais em cada unidade.
É a partir das entregas informadas pelos gestores das unidades que o processo de dimensionamento é iniciado, tendo o Sistema de Dimensionamento de Pessoas (Sisdip) como ferramenta para sistematização dos dados de servidores alocados e respectivas entregas esperadas de cada unidade. Para garantir a uniformidade e a eficácia do dimensionamento, o sistema oferece um banco de entregas em diversas categorias de serviços, compilado a partir da experiência de mais de 100 órgãos que já utilizaram a ferramenta, as quais podem ser adaptadas pelos usuários às necessidades de suas equipes.
Isso permite uma análise abrangente, indo além dos dados quantitativos e considerando o contexto organizacional, tecnológico e as competências mais relevantes. É nesse ponto que a alta gestão tem a oportunidade de verificar a aderência das entregas informadas por suas unidades administrativas com suas metas e atribuições sob uma perspectiva estratégica; sua real contribuição para os resultados almejados pelo órgão. A partir dessa análise, uma série de decisões pode ser tomada para uma melhor governança dos processos de trabalho, ações de planejamento e identificação de ações prioritárias a cargo de cada unidade, movimentação de pessoal, capacitação de equipes, etc.
Indicadores qualitativos e quantitativos embasam decisões sobre gestão de pessoas
Desse modo, o DFT não se limita apenas a fornecer informações sobre a quantidade ideal de pessoal; também oferece indicadores qualitativos e quantitativos para orientar decisões estratégicas. Isso inclui informações sobre a complexidade das tarefas, demandas específicas e competências necessárias, permitindo uma gestão mais eficaz e aprimorando o desempenho das equipes. É, portanto, uma ferramenta que possibilita a efetivação da ‘gestão estratégica de pessoas’, tema caro ao atual debate de transformação do Estado para a oferta de mais e melhores serviços à população.
Hoje, a adesão ao Modelo Referencial de Dimensionamento da Força de Trabalho é voluntária, e vários órgãos já aderiram a essa abordagem, reconhecendo seu potencial para melhorar a gestão de pessoas e o planejamento estratégico da recomposição da força de trabalho. Entretanto, pelo sucesso e tempo de maturação da iniciativa, especialistas no tema reforçam a necessidade de institucionalização da prática como requisito essencial para análise de novas contratações e movimentação de servidores no setor público.
Até aqui, o objetivo principal foi a difusão da metodologia aos órgãos interessados. Além de 85 órgãos que tiveram pelo menos um ciclo completo de DFT concluído, outros 18 órgãos estão com o processo em andamento e já dispõem de unidades e entregas cadastradas no SISDIP, totalizando 103 órgãos com acesso ao sistema e capacitação para usá-lo. Considerando apenas os 15 órgãos que rodaram o ciclo mais recente de DFT, iniciado em maio/24, a média de dimensionamentos incluídos no SISDIP passou para 165 unidades por órgão, um vultoso aumento em comparação com a média de apenas 5 unidades por órgão que se tinha até 2023. Essa ampliação de cobertura de unidades dimensionadas é um efeito direto da ação de mentoria implementada com os órgãos que aderiram ao DFT em 2024, que possibilitou percentual relevante das unidades dos órgãos aderentes chegarem até o final do processo.
Institucionalizar prática do dimensionamento da força de trabalho no setor público é desafio
Doravante, o foco é efetivamente impactar o planejamento dos órgãos com a implementação do dimensionamento. A capacitação dos profissionais, essencial para a implementação bem-sucedida do DFT, foi o primeiro passo. A partir de agora, o desafio é atuar juntamente com os órgãos para que o dimensionamento se torne prática institucionalizada, integrada ao planejamento anual de cada órgão, como forma de melhoria da governança de suas políticas e subsídio à gestão estratégica de pessoas.
Nos próximos anos, o objetivo é expandir a metodologia para os órgãos ainda não dimensionados, com prioridade para os ministérios ainda não contemplados, e tornar o DFT procedimento padrão a ser adotado em toda a administração federal, como requisito para novas contratações e movimentação de pessoal. Uma das estratégias para viabilizar essa expansão é criar e consolidar uma rede de especialistas e multiplicadores dentro da administração pública, formada pelos servidores já certificados como especialistas em DFT, para atuarem como facilitadores de equipes volantes a serem instituídas nos diversos órgãos federais.
A implementação bem-sucedida em cada um dos órgãos requer apoio da alta gestão e uma comunicação eficaz com todos os envolvidos. A ideia de times volantes coordenados pelo MGI, com uma agenda de trabalho pactuada com os órgãos, como parte do processo de provimento de novos servidores, parece um caminho promissor para a institucionalização da ferramenta. Essa abordagem não se concentra apenas na quantidade de pessoal, mas também nas competências necessárias para atender às demandas da sociedade em constante mutação. É uma ferramenta valiosa para melhorar a eficiência e a eficácia do setor público, garantindo que ele atenda de forma adequada às prioridades de governos.
Referências bibliográficas
1 DRUMOND, F. Diagnóstico Institucional do Serviço Público na América Latina. BID, 2023.
2 Sistema informatizado desenvolvido pelo MGI em parceria com a Universidade de Brasília como parte do arcabouço instrumental do Dimensionamento da Força de Trabalho proposto como modelo a ser aplicado em toda a administração pública federal.