A empatia entre líderes e liderados é reconhecida como um dos principais elementos para o exercício de uma liderança autêntica, aquela em que a equipe realmente trabalha “com brilho nos olhos”.
Nos estudos sobre tipos de liderança, em especial no serviço público, pouco se fala do conhecimento da própria equipe de liderados sobre as características dos seus pares no que se refere à aptidão para exercer a liderança do grupo.
O cenário mais comum de liderança no serviço público decorre da escolha “de cima para baixo”, em que uma liderança hierarquicamente superior indica de forma monocrática os líderes das equipes que lhe são subordinadas, em geral indicando inclusive pessoas de fora dos respectivos grupos ou mesmo externas à instituição, na presunção de que alguém “de fora” trará conhecimento e motivação adicionais para o enfrentamento dos desafios do setor.
Tal prática desmotiva os servidores de carreira, tendo em vista que as escolhas são feitas geralmente por critérios de ligação pessoal com a chefia superior ou ignorando a experiência e as opiniões da equipe que será liderada, o que pode levar o servidor a identificar que o lugar em que é mais difícil assumir um cargo de liderança é aquele onde ele próprio trabalha.
Propomos, portanto, uma reflexão sobre os possíveis ganhos caso fosse permitido que os próprios servidores indicassem seus líderes. Para isso, faremos uma análise com base na seguinte proposta: a promoção de eleições sem candidaturas a cada dois anos para cargos do 2º escalão em diante em setores com mais de cinco anos e mais de cinco integrantes. Nesse caso, seria ainda possível apontar que venha alguém de fora do setor.
Primeiramente, o grande destaque da proposta é a realização de eleições entre os servidores. Contra ela, poderia pesar o argumento de que haveria risco de incompatibilidade política entre as lideranças e a alta gestão. Particularmente, nos meus quase 20 anos de serviço público, nunca presenciei um servidor mudar de postura ou de motivação em razão da mudança de um presidente da República, um governador ou ministro de Estado, por exemplo. Em termos práticos, o que testemunho é que os servidores mantêm o foco no desempenho de suas respectivas atribuições.
Seriam inúmeros os pontos positivos da eleição entre servidores, como o aproveitamento da sabedoria a respeito dos processos de trabalho construída pelo próprio setor. Além disso, a liderança seria exercida com legitimidade, mantendo continuidade nas atividades e na produção de conhecimento independentemente das mudanças nos governos. Entendemos, ainda, que seria mais fácil capacitar para liderança uma pessoa que já tem o reconhecimento dos seus pares do que desenvolver admiração e sinergia diante de uma liderança inteiramente nova.
O fator “eleições sem candidaturas a cada dois anos” teria como finalidade permitir que todos fossem votados, independentemente do desejo de exercerem um cargo de liderança, o que traria uma motivação contínua para cada servidor, que passaria, a cada biênio, pela avaliação por seus pares. Outro ponto positivo é o reconhecimento de servidores que muitas vezes não se reconhecem como líderes, mas que, aos olhos dos seus colegas, seriam os mais adequados para o exercício dos cargos de chefia.
Como pontos negativos da proposta, identifica-se o risco de algum setor imaturo eleger alguém por impulso, bem como o risco de formação de “panelinhas”, visando à escolha das mesmas pessoas. Como forma de atenuar esses riscos, a proposta prevê que tais eleições ocorram apenas em setores com mais de 5 anos de existência, tendo em vista que, em setores muito recentes, deve-se reconhecer como oportuna a vinda de uma liderança mais experiente para o amadurecimento dos processos de trabalho do novo setor.
Por sua vez, a restrição para eleições em setores com mais de cinco integrantes tem como justificativa o fato de que, em equipes pequenas, uma pessoa a mais, de fora da equipe, constituiria um acréscimo de força de trabalho considerável.
Por fim, a proposta prevê que, no ato da votação, haja a possibilidade de votar por trazer alguém de fora do setor, o que contornaria situações de falta de liderança autêntica dentro do próprio grupo, ou mesmo contemplaria um sentimento coletivo de que receber um novo integrante, com novas ideias e estilos, seria benéfico.
Diante do exposto, entendemos que a adoção da proposta traria muito mais ganhos do que riscos para a Administração Pública, e defendemos que ela seja utilizada, se não como único meio para escolha das lideranças, pelo menos como um componente significativo para o processo de seleção.
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