Especialistas da República.org avaliam que projetos apresentados por Tábata Amaral (PSB-SP) e pelo PT trazem avanços
Por Célia Costa — Especial para a República.org
Na Câmara dos Deputados, as mais recentes propostas para restringir os supersalários incluem dois projetos de lei (PLs) e uma proposta de emenda constitucional (PEC).
As três propostas se diferenciam do PL 2.721/2021, também conhecido como PL dos Supersalários ou PL dos “Penduricalhos”. Em tramitação no Senado Federal, o projeto de lei tem recebido críticas de especialistas e organizações da sociedade civil, que não apoiam sua aprovação.
Uma nota técnica produzida pela Transparência Brasil e pela República.org indica que o PL 2.721/2021 pode legalizar os gastos com salários superiores ao teto, em vez de restringi-los. Caso fosse aprovado, o projeto permitiria o pagamento de aproximadamente R$ 7,1 bilhões em benefícios extras para os juízes.
PL 2.721/2021 é criticado por legalizar supersalários
O documento aponta que o PL dos Supersalários legaliza os chamados “penduricalhos” — verbas classificadas como indenizatórias que aumentam significativamente os salários de juízes e magistrados, em alguns casos ultrapassando R$ 1 milhão.
Verbas indenizatórias são auxílios, licenças e outros benefícios que, por não serem considerados remuneração, permitem que os pagamentos ultrapassem o teto.
A análise mostra ainda que 32 benefícios, convertidos ou consolidados como verbas remuneratórias nos contracheques de membros do Judiciário, custaram R$ 10,5 bilhões em 2024. Verbas remuneratórias, diferentemente das indenizatórias, são aquelas diretamente ligadas à contraprestação pelo serviço prestado.
Propostas de Tábata Amaral enfrentam privilégios salariais
A deputada federal Tábata Amaral (PSB-SP) é a autora do PL 3.328/2025 e da PEC do Fim dos Supersalários, e explica o motivo de apresentar, simultaneamente, duas propostas sobre o mesmo tema.
“Apresentamos tanto o PL 3.328/2025 quanto a PEC do Fim dos Supersalários porque entendemos que este é um problema complexo e que precisa ser enfrentado em duas frentes. A PEC muda a Constituição para fechar brechas estruturais e o PL regulamenta a lei para impedir abusos no dia a dia. Estas são medidas complementares para acabar de vez com os privilégios acima do teto”, explica a parlamentar.
Ela está buscando assinaturas para a PEC.
O outro projeto, o PL 3.401/2025, é de autoria da bancada do Partido dos Trabalhadores (PT) na Câmara. O deputado federal Lindbergh Farias, líder da bancada, protocolou a proposta no dia 15 de julho.
Organizações da sociedade civil apoiam mudanças legais
O projeto de lei e a PEC apresentados pela deputada Tábata Amaral têm o apoio de uma coalizão de organizações da sociedade civil, entre elas a República.org. Em abril deste ano, um manifesto assinado por dez organizações se posicionou pelo fim dos supersalários no serviço público brasileiro e pela construção de uma política remuneratória justa, alinhada aos princípios constitucionais da moralidade, da legalidade e da eficiência na administração pública.
Além da Transparência Brasil e da República.org, assinam o manifesto as seguintes organizações: Movimento Pessoas à Frente, Fundação Tide Setubal, Plataforma Justa, Instituto Democracia e Sustentabilidade, Movimento Brasil Competitivo, Pacto Nacional pelo Combate às Desigualdades, Associação Livres e Centro de Liderança Pública.
Especialistas apontam avanços das novas propostas
Comparando os projetos de lei, especialistas da República.org apontam que as propostas apresentam avanços para limitar os supersalários.
“Entendemos que o avanço dos dois projetos de lei e das possíveis medidas apresentadas pelo Grupo de Trabalho da Reforma Administrativa dependerá da construção de consensos políticos e técnicos durante a tramitação legislativa, mas reconhecemos a importância e o potencial de tais propostas para a redução da desigualdade remuneratória e o melhor uso dos recursos públicos. Nesse sentido, é urgente o comprometimento do Congresso com o fim dos supersalários”, avalia Fernanda Melo, especialista em Advocacy na República.org.
Ana Pessanha, economista e mestre em administração pública, considera as propostas como um grande avanço na tentativa de apresentar ao debate alternativas mais efetivas.
Reconhecemos a importância e o potencial de tais propostas para a redução da desigualdade remuneratória e o melhor uso dos recursos públicos.
Fernanda Melo, especialista em Advocacy na República.org
“Os dois tratam do rol de benefícios. São muito parecidos e trazem definições mais corretas das verbas. O PL 3.328/2025, da deputada Tábata Amaral, detalha e cria regras para cada uma das verbas e pagamentos indenizatórios. Já o PL 3.401/2025, apresentado pela bancada do PT, faz uma proposta bem-vinda sobre a auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU), estabelecendo a periodicidade das auditorias, que devem ser anuais”, analisa a especialista em Conhecimento da República.org.
O PL 3.328 apresenta critérios específicos para a caracterização de verbas como indenizatórias, exigindo, por exemplo, a comprovação da impossibilidade de gozo de férias por meio de processo administrativo. O texto também estabelece subtetos para diferentes tipos de benefícios, como 3% do salário para auxílio-transporte e 7% para o uso de veículo próprio em serviço.

Novas regras visam barrar benefícios que burlam o teto
“O nosso PL faz o oposto do 2.721/21: em vez de legalizar privilégios, ele proíbe benefícios que hoje são usados para burlar o teto. Nesse sentido, ele acaba com férias acima de 30 dias, adicionais fictícios, licenças indevidas e pagamentos retroativos, além de exigir critérios claros para qualquer verba indenizatória”, acrescenta Tábata Amaral.
Já o PL 3.401 detalha como será feita a incorporação de verbas ao salário para efeito de cálculo do teto, mas não apresenta uma conceituação clara sobre o que são verbas remuneratórias. O PL 3.328, por sua vez, delimita expressamente esse conceito e veda o enquadramento de determinados benefícios como remuneração.
Outro ponto em destaque no PL 3.401 é o estabelecimento de um teto proporcional à jornada de trabalho, o que pode aumentar a equidade no setor público.
A proposta tem um artigo dedicado à utilização de critérios para estabelecer o teto salarial de cada instância de governo. Por exemplo, o subsídio mensal dos desembargadores dos tribunais de Justiça. A remuneração é limitada, em qualquer caso, a 90,25%, em espécie, dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).
Nos estados, o limite é o salário do governador. Já nos municípios, é o salário do prefeito. Enquanto isso, o salário dos deputados estaduais, federais e distritais é estabelecido no âmbito do Poder Legislativo.
O PL 3.041 destaca ainda a criação do Portal Nacional de Remunerações, com prazo de implantação de até 12 meses. A proposta também atribui ao Tribunal de Contas da União (TCU) e ao Ministério Público (MP) a responsabilidade de fiscalização, medida considerada positiva, mas que pode gerar conflitos de competência entre os órgãos.
Supersalários devem entrar na pauta da Reforma
A proposta de Reforma Administrativa prevê limitação aos supersalários no Executivo, Legislativo e Judiciário. Em entrevista à Folha de S.Paulo, o coordenador do grupo de trabalho (GT) da Câmara, o deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), disse que o texto apresentará 17 propostas de correção de privilégios.
O texto prevê ainda que sejam estabelecidos critérios para se definir o que é verba indenizatória e remuneratória para impedir que haja uma lista de exceções, como aconteceu na votação do PL 2712/2021 na Câmara — hoje em tramitação no Senado. O coordenador do GT ressaltou ainda que as exceções terão que ser definidas em lei e não poderão ser criadas, por exemplo, por vontade própria do Judiciário.
Foto no topo: Roque de Sá/Agência Senado.