É óbvio dizer que estamos em meio a profundas e necessárias transformações. Chico Gaetani e Virgilio Almeida, no jornal “Valor”, de 17/1/22, nos indicam, por exemplo, as conquistas extraordinárias que poderiam ser feitas na educação, saúde, participação política, equidade e outros, com a digitalização. Sabemos que há muitos campos mais a acrescentar. Menos óbvio, no entanto, é saber como “chegar lá”. Além dos aportes tecnológicos, os comportamentos têm que ser mudados, capacidades têm de ser desenvolvidas, relações de poder renegociadas, corações e mentes, conquistados. Qualquer tipo de mudança demanda uma estratégia.
Há um razoável número de estudos feitos sobre sucessos e fracassos em um processo de mudança organizacional. Vejamos o que nos indicam.
Índice
O problema
Contexto político e Stakeholders – Públicos estratégicos
Plano de capacitação
Reform Champions – indivíduos convictos da necessidade de mudança
Comunicação top down e bottom up – indo além das hierarquias
O problema
Em geral, começam por apontar a necessidade da definição de qual é o “problema” a ser solucionado. Implícita nessa definição está a forma como a organização – ou sua liderança – se vê perante a mudança que tem que ser feita. Esse exercício poderá também redundar na elaboração de uma visão futura da organização.
De modo contínuo, o “problema” pode ser decomposto em “subproblemas”, o que irá facilitar a elaboração da estratégia e dos planos de ação. Recomendam os estudos também buscar evidências, para esse primeiro diagnóstico.
Contexto político e Stakeholders – Públicos estratégicos
Um próximo passo pode ser a realização de uma análise de contexto político. Mudanças significam frequentemente a necessidade de se chegar a um novo equilíbrio de forças, com ganhadores e perdedores. É fundamental fazer essa stakeholder analysis, para tentar envolver e alinhar os interesses desses múltiplos grupos aos objetivos traçados.
Desde o início, é fundamental que a liderança e demais stakeholders estejam comprometidos com o processo que irá se desenrolar. Conhecer o contexto institucional – o conjunto de regras que regulam o campo a ser modificado – é uma exigência, para que esse não se torne um obstáculo.
Plano de capacitação
Mais um passo deve ser dado, na direção de se conhecer a capacidade da organização: quais serão as competências necessárias, quais as já existentes, dos distintos grupos dentro da organização. Esses insumos serão fundamentais para a elaboração de um plano de capacitação.
Reform Champions – indivíduos convictos da necessidade de mudança
Nesse ponto, é preciso reunir a liderança da organização, que irá conduzir o processo, à qual devem ser agregados reform champions, indivíduos convictos da necessidade de mudança, capazes de influenciar os grupos aos quais pertencem, independentemente de sua posição hierárquica. Será esse grupo ampliado que deverá traçar a estratégia que deverá ser implementada, estabelecendo desde o início os marcos intermediários. Será também esse grupo que deverá periodicamente avaliar a realização do plano e eventualmente fazer os ajustes necessários, em um processo iterativo.
Comunicação top down e bottom up – indo além das hierarquias
Como componente prioritário, é preciso construir um processo de comunicação contínuo, entre a liderança e a base da organização, em movimentos top down e bottom up. A experiência vem demonstrando ser essencial abrir canais permanentes de escuta com todos os segmentos, para conhecer propostas inovadoras de quem está no “chão de fábrica”, para corrigir ações equivocadas, tratar das resistências e da desinformação. Compartilhar os avanços com todos permite uma integração e adesão ainda maior.
A gestão da mudança vem sendo objeto de estudo há décadas, por múltiplos pesquisadores. Apoiar-se nesse conhecimento pode impulsionar essa complexa travessia, sem tantos percalços.
Esta nota é de responsabilidade dos respectivos autores e não traduz necessariamente a opinião da República.org nem das instituições às quais os autores estão vinculados.
Evelyn Levy
Especialista sênior em Gestão Pública, consultora em organismos multilaterais para projetos governamentais desde 2007. Doutora em Administração pela EAESP/FGV, lecionou no curso Gestão de Políticas Públicas da EACH/USP. Foi diretora da Enap, Secretária de Gestão do Ministério do Planejamento e Subsecretária de Gestão e RH do Estado de São Paulo. Participa do Movimento Pessoas à Frente.