Organizado em Berlim, evento reúne especialistas de vários países para estimular cultura de inovação e reconhecimento no setor público

Nesta quinta-feira, 2 de junho, o festival internacional Creative Bureaucracy chega à quarta edição. Com participação de mais de 150 convidados (especialistas públicos com atuação em diversos setores), o evento espera receber visitantes aos milhares, vindos de diversos países. 

Realizado no centro de Berlim, o Creative Bureaucracy promove a inovação no setor público e reconhece o papel dos profissionais públicos para uma sociedade mais justa e sustentável

A premissa do festival vem ao encontro dos intuitos da República.org: fortalecer o espírito público entre os burocratas que diariamente fazem a diferença nas organizações públicas. Em 2022, somos apoiadores desta iniciativa, que tem formato híbrido — toda programação do palco principal (localizado no belo auditório do Radialsystem) é transmitida ao vivo pela internet, a partir das seis da manhã (horário de Brasília). 

Para falar sobre a importância de cultivar boas ideias e manter a mente criativa em prol de administrações públicas cada vez mais modernas e efetivas (capazes de enfrentar os efeitos da pandemia, das mudanças climáticas e do mundo digital), conversamos com a diretora executiva do Creative Bureaucracy, a cientista política Anna Schneider, que assumiu o posto neste ano.

“Servidores públicos são heróis anônimos que lutam pelo bem comum embora raramente recebam o devido reconhecimento“, ela defende. Leia a seguir os melhores momentos da entrevista.

Para assistir ao evento, inscreva-se gratuitamente pelo site creativebureaucracy.org.

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Pode falar um pouco sobre sua trajetória profissional e o cargo que ocupa atualmente?

Sou diretora do festival Creative Bureaucracy desde fevereiro de 2022. Como cientista política, trabalho há vários anos no terceiro setor, e me especializei em organização de eventos. Antes, trabalhei para associações e institutos de pesquisa, e também para o estado de Mecklenburg-Vorpommern [no norte da Alemanha]. Tenho, portanto, vivência na área e um monte de ideias para um setor público moderno e inovador.

Quais mudanças você considera mais urgentes no serviço público e por quê?

Sigo a filosofia do presidente do festival, [o urbanista inglês e cofundador do evento] Charles Landry, de que tudo se resume a como encaramos a vida. Em tudo o que fazem, os servidores devem levar em consideração se suas ações realmente servem ao público. E não negligenciar grupos minoritários. O setor público tende a se flexibilizar, e as crises vão demandar ações céleres destes profissionais. Ter o bem comum como bússola moral será fundamental na resolução dos problemas.

Quais atitudes impedem o setor público de ser criativo e inovador, e como podemos combatê-las? 

Algumas instituições governamentais estão focadas apenas na lógica interna, se distanciaram do propósito original que deveriam cumprir. Servir à lógica e às regras internas de uma instituição que existe há décadas ou mesmo séculos pode levar a um bloqueio de ideias. Um ponto fundamental para ampliar a criatividade e inovação é abrir essas instituições para o mundo externo. Ferramentas e métodos de participação pública são elementos fundamentais para a mudança. Assim como colaborações com a economia e a ciência, e as análises externas.

Levando em conta as transformações provocadas pela pandemia de coronavírus, que novos papéis a criatividade desempenha para as organizações e os servidores públicos? 

Ainda que a pandemia tenha sido e ainda seja devastadora e desgastante, ela revela para muitas pessoas no serviço público que suas contribuições salvam vidas de verdade. Em muitas situações, estes profissionais foram forçados a decidir entre seguir as regras ao pé da letra ou ajudar os cidadãos de forma menos convencional. E a maioria escolheu a última opção. Com o apoio de políticos e a apreciação da sociedade, é possível fomentar um novo espírito de confiança nas administrações, de modo que a criatividade, a experimentação e a responsabilidade individual se tornem valores essenciais [nestes espaços].

De que maneira iniciativas como o festival Creative Bureaucracy podem ser benéficas para os servidores públicos?

Servidores públicos são heróis anônimos que lutam pelo bem comum embora raramente recebam o devido reconhecimento. Queremos mudar esse quadro, celebrá-los: honrar e incentivar os agentes de inovação e transformação por se esforçarem para que coisas boas aconteçam no setor público e não sejam mais negligenciadas. Em toda administração há soluções excelentes e criativas para quase todos os problemas da comunidade. O Creative Bureaucracy coloca essas melhores práticas e as pessoas por trás delas no centro das atenções para que inspirem outras pessoas. O festival tem por objetivo renovar a reputação das administrações públicas e atrair novos talentos.

O que você diria para alguém que está pensando em ingressar no setor público, mas não sabe ao certo como começar?

Há tantas carreiras diferentes no serviço público! Especialistas em TI, motoristas, professores, pesquisadores, zeladores, soldados, médicos, e por aí vai. Em linhas gerais, diria que você deve começar naquilo que é bom e depois se candidatar ao serviço público em alguma especialidade ao longo do caminho. Costuma dar certo. Eu me especializei em organização de eventos sem saber que havia cargos para isso em administrações públicas e ministérios — e há.

Criatividade burocrática é…

Trocar a cultura do “porque não” pela do “e se”. No meu último trabalho como funcionária pública, eu recebia a mesma resposta toda vez que questionava alguma coisa: “É assim que sempre fizemos”. Um burocrata criativo é alguém que diz: “E se fizéssemos diferente?”. 

O que você costuma fazer para se manter criativa? 

Não sou tão criativa quanto meu cargo dá a entender. Sempre mantenho a mente aberta. Se deixar inspirar por boas práticas e inovações de outras pessoas pode ser muito recompensador. Você não precisa reinventar a roda, só tem de estar preparado para mudar de ideia e ser convencido por argumentos sólidos.

Você recentemente leu um livro ou assistiu a um filme ou série que gostaria de recomendar aos servidores públicos brasileiros?

Recomendo muito Office Kingdom, curta-metragem de Salvatore Centoducati, Eleonora Bertolucci, Giulio De Toma e Ruben Pirito [o filme italiano de animação, premiado em festivais internacionais, é um retrato poético da burocracia dos tempos atuais]. Fala sobre o que estamos combatendo, e nós vamos vencer [essa luta] — ninguém segura a gente!

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