Resumo:
O Brasil já conhece bem seus principais desafios, especialmente em saúde, educação, segurança e no enfrentamento à desigualdade, mas segue travado entre diagnósticos e a falta de ação. O artigo defende que apenas com as chamadas “reformas gêmeas”, política e administrativa, será possível melhorar a qualidade das decisões, combater práticas clientelistas, dar eficiência à gestão pública e garantir que políticas e serviços cheguem à população de forma eficaz e contínua.
Índice:
País precisa melhorar capacidades política e administrativa para entregar melhores serviços à população
Disputas políticas limitam a tomada de decisão sobre políticas públicas
Reformas política e administrativa são urgentes
O Brasil evolui muito lentamente na solução efetiva dos problemas mais urgentes enfrentados pela sociedade em campos como a educação, a saúde, a segurança pública e o desenvolvimento sustentável, com consequências graves para o combate à pobreza e à desigualdade e para o crescimento econômico.
Não faltam exemplos. Avançamos na universalização da educação, mas empacamos na qualidade do ensino. Idealizamos o SUS, porém falhamos na prestação dos serviços de saúde de acordo com as necessidades da população. Criamos, em 2018, o Sistema Único de Segurança Pública, mas não conseguimos implementá-lo até hoje. Aprovamos uma lei de responsabilidade fiscal, há 25 anos, e seguimos enfrentando a fragilidade fiscal do Estado. Fizemos uma reforma na constituição, em 1997, permitindo a demissão de servidores públicos por insuficiência de desempenho, mas,, até hoje, não aprovamos a lei que regulamenta o dispositivo constitucional.
País precisa melhorar capacidades política e administrativa para entregar melhores serviços à população
Nosso problema não parece estar nos diagnósticos sobre os desafios sociais, econômicos e ambientais do país, e sim nas capacidades política e administrativa para tomada de decisão e sua efetiva implementação com eficiência e qualidade. No processo decisório, muitas vezes, postergamos as decisões e levamos décadas para passar do diagnóstico à ação, como no caso das reformas tributária, previdenciária e administrativa.
Também não costumamos considerar dados e evidências sobre os resultados das políticas públicas. Como efeito, decisões equivocadas são tomadas, acarretando desperdício de recursos orçamentários em ações que pouco acrescentam ao desenvolvimento do país e à qualidade de vida da população.
Isso se revela nos privilégios a grupos empresariais, a algumas carreiras de servidores públicos, na persistência de programas sociais ineficientes e nas emendas parlamentares que ignoram o planejamento público. Compromete-se, assim, a qualidade do gasto público, com sérias consequências para a credibilidade do Estado e da democracia.
Disputas políticas limitam a tomada de decisão sobre políticas públicas
A qualificação das decisões e a melhoria da capacidade de implementação das políticas públicas nos obriga a empreender esforços visando melhorar a prática política e aprimorar as capacidades institucionais da administração pública. É sabido que a forma como a disputa política está organizada limita a tomada de decisão sobre políticas públicas direcionadas ao interesse coletivo. Por sua vez, o marco regulatório administrativo e de controle do setor público, por ter foco em processos (em vez de resultados), coloca restrições gerenciais e técnicas à implementação das decisões, e a morosidade na resolução de problemas cotidianos resulta, invariavelmente, na perda de confiança da população no Estado.
Reformas política e administrativa são urgentes
Superar esses entraves, portanto, torna urgente endereçar esforços para priorizar as reformas gêmeas: a política e a administrativa. Trata-se de reformas integrativas, complementares e imprescindíveis para a gestão no ambiente público. Um dos objetivos centrais da reforma política deve ser a concretização de normas que direcionem as disputas partidárias em torno de projetos que apontem para a superação dos reais problemas enfrentados pela população, como educação, saúde e segurança pública, qualificando, assim, a tomada de decisão.
Além disso, é preciso rever as práticas patrimonialistas, clientelistas e fisiológicas na relação da classe política com o Estado. É forçoso, por exemplo, frear nomeações para cargos de confiança na administração pública que não estejam amparadas em critérios meritocráticos, para combater o desperdício de recursos orçamentários e a ineficiência na prestação dos serviços públicos.
A reforma administrativa, por sua vez, deve ter como objetivo aumentar a capacidade do Estado de implementar as decisões políticas com rapidez e transformar os recursos disponíveis em serviços públicos eficientes, eficazes e efetivos, além de promover transparência na tomada de decisão e na gestão dos recursos. Deve-se, igualmente, incentivar a disseminação de boas práticas de gestão existentes no país, evitando erros já cometidos e interrompendo a descontinuidade administrativa quando da troca de governos e, sobretudo, desincentivando a paralisação de projetos que estão produzindo resultados. Sabe-se, afinal, que os problemas do país são de tal magnitude que não se resolvem em um único mandato.
A ampliação na transparência da gestão é fundamental para que a sociedade possa acompanhar o desempenho dos governos, cobrar resultados e responsabilizar os governantes, contribuindo, assim, para qualificar a gestão pública e a prática política.
Avançar nas reformas política e administrativa são passos cruciais para superar as disfuncionalidades na administração do país. A primeira organiza a definição de prioridades e a tomada de decisão da sociedade, e a segunda aumenta a capacidade de entrega de resultados do setor público para a população, não só durante o período de um governo, mas para as futuras gerações. São dois lados da mesma moeda.